terça-feira, 13 de dezembro de 2016

O IRMÃO QUE VIGIAVA




















1
Perdi o meu pai, criança,
Eu era muito pequena;
Morreu de morte morrida,
Muito triste aquela cena;
Tão de vez, quase maduro
A Deus deixei meu futuro
Minha dor de fazer pena!
2
Porrada, chumbo ou faca
Isto é morte matada;
Mas, bebeu água de coco
E misturou com coalhada;
De repente, pereceu,
Morte morrida se deu,
A vida findou do nada.
3
Pai com vinte e quatro anos
Morreu, eu só tinha seis;
Minha mãe enviuvou,
Os rebentos eram três,
Para carregar nas costas;
E eu, sequer fiz apostas
Nem de hora, dia, mês.
4
Papai não tinha emprego,
A gente foi a herança;
Eis a riqueza da casa
Que eu guardo na lembrança;
Mamãe nova e bonita
Só se vestia de chita
Sem dinheiro nem poupança.
5
A sua e mais três bocas
Quem ia alimentar?
Ela não teve escolha,
O jeito foi arrumar
Um padrasto para a gente
E eu triste e carente
Foi difícil aceitar.
6
Eu não pude fazer nada,
Não dão ouça à menina!
Mesmo com querer e sonho,
Mas, a vida Severina;
Do mais velho, meu irmão,
Fez-se pai na direção
Transformou a minha sina.

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OS AMORES DO CANGAÇO





















1
O cangaço no Nordeste,
Não contempla só o ódio;
Há momentos de beleza,
Onde o cloreto de sódio,
Tempera bem o amor
E leva todos ao pódio.
2
Lampião pelas andanças
Marcou assim sua sina;
Perdidinho pelas brenhas
Do amor de uma menina;
Que flechou seu coração,
O seu nome, Lamparina.
3
Mas, o destino dum homem
Ao que tange o amor;
Ainda é um mistério,
Tal qual no jardim a flo;
Que desabrocha um dia,
Entre espinhos no albor.
4
De repente apareceu,
Outra moça no caminho;
Seu nome era a beldade,
Nos olhos tanto carinho;
Era Maria Bonita,
A rara flor sem espinho.
5
Maria e Lamparina
Tinham semelhante alma;
Belíssimas e quão doces,
Como o fruto da palma;
Porém na sina do amor,
Quase que perderam a calma.
6
Dois destinos femininos
Buscam um só coração;
Pois sendo o mesmo alvo:
Virgolino, o Lampião,
Que se via dividido,
No afã dupla paixão.
7
Duas lindas nordestinas
Que invadiram o seu ser;
De homem bravo e forte,
Atiçaram o seu viver;
Ao sentimento do amor,
Que em tudo faz vencer.

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OS DESAFIOS DE EVANEIDE





















1
A MORTE ENSINA A VIVER.
Esta expressão é minha;
Eu acabei de criar,
E me veste inteirinha;
Cabe à minha própria pele,
Quem quiser que me revele;
Eis minha alma purinha.
2
Sócrates, William Shakespeare,
Galileu e outros mais;
Criaram as suas máximas.
Então, senti-me capaz;
Ante a mediocridade,
Expressei minha verdade,
Com o meu pensar voraz.
3
Eu era muito pequena,
Quando eu senti nas costas,
O fardo da minha vida;
Porém, sequer fiz apostas,
E sendo eu nordestina,
Deus traçou a minha sina,
Aos poucos vi as respostas.
4
Nasci numa terra árida,
Esturricada e dura;
Igual coração de homem
Esta medíocre figura;
Inclusive o do meu pai,
Que sequer dava um ai,
Nem de dor nem de brandura.
5
- Como Deus criara gente
Tão rude e tão cruel?
Traçoeira  e tão braba,
Igualmente cascavel?
- Não, Deus não os fez assim;
Deram-se a esse fim.
- Eram puros como mel.
6
Aprendi que a seca era
Um ciclo muito constante;
Ora pior que o Saara,
Ora a Amazônia gigante;
Mas, o coração do homem,
Quão patife nos consomem
Como bruto ignorante.
7
Pense na complexidade
Da tal natureza humana!...
Eu era muito calada,
Igual estátua insana,
De Rodin a escultura,
Coisa mais linda e pura;
O meu ser não se engana.

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MULHER TODA CORAÇÃO!





















1
Eu queria ser princesa,
Ao menos nome eu tinha;
Dayane da Inglaterra,
Dado por mãe e vizinha;
Disse que ela morreu,
Um acidente se deu,
Bem antes de ser rainha.
2
Não me lembro de meu pai,
Aliás, eu tive um monte;
O meu avô e meus tios,
Esses eram minha fonte;
Me davam muito carinho,
Embalavam no seu ninho,
Me mostravam horizonte.
3
Eles me davam presentes,
Em minha data festiva;
E no meu aniversário,
Eu me sentia cativa;
A verdadeira princesa,
Com toda minha certeza,
Eu era muito ativa.
4
Mamãe dizia: - Princesa!
Eu inventava a coroa;
Para botar na cabeça
Me sentindo numa boa;
Mas, quando fiz quinze anos,
Eu mudei todos meus planos;
Aí, minha mente voa.
5
Educada por vovó
E por minhas quatro tias;
Solteironas e beatas,
Eu seguia duas vias:
Uma de fazer besteira,
Outra, de me tornar freira,
Com datas, horas e dias...
6
Tive bonecas bonitas,
Os meus vestidos mais belos;
Porém, vó muito católica,
Tinha seus sonhos singelos;
Me via lá num convento,
E eu com grande tormento,
- Meus sorrisos amarelos...
7
Então eu fui batizada,
Fiz primeira comunhão;
Fiz crisma, grupo de jovens,
Não perdia confissão;
Toda missa aos domingos,
Mesmo com meus choramingos,
Deus dava minha benção.

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AS TRAIÇÕES DE LINDALVA




















I
Das cinco irmãs que eu tinha
Quatro haviam se casado;
A última, como sempre,
Fugiu com seu namorado;
Pra se casar escondida
Do meu pai, era a saída,
Pra se livrar desse fardo.
II
Meu pai era homem bom
Dava trabalho, alimento;
Dormida pros empregados,
Comida e suprimento;
Mas brabo e perspicaz
Tinha sempre um capataz
Com ele todo momento.
III
Não tinha muita conversa;
Bem visto na região,
Como coronel Pedreira;
Era um domingo, então.
Justo quando o meu pai
Na feira num vem e vai.
Alguém fez a indagação.
IV
De repente, assim falou:
- Porque o senhor não foi
Ao casamento da filha?
Papai sequer disse oi...
- Ôxe!!! Mais que casamento?!
Quer me fazer de jumento?!
Enraivou-se feito um boi.
V
Não esperou por resposta
Veloz esporou a mula;
Riscou de frente à capela
Saltou numa raiva fula;
Para os noivos foi direto
E findou com o secreto
Da sua filha caçula.
VI
Quando o padre ia falar
Se a noiva aceitava... 
Viu alguém pegando ela
Pelos braços lhe puxava;
A sair da igreja a fora
Num assombro caipora,
O meu pai esbravejava.
VII
Nem noivo, nem sacerdote
Combateram a violência;
Ficaram todos aflitos
Alguém rogou paciência
Para São Sebastião,
E meu pai feito leão.
O padre gritou: - Clemência!

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AS CONFISSÕES DE JOVELINA




















I
Eu “Confesso que Vivi”.
Esta máxima é de Neruda;
Eu tirei de um livro seu
Dela fiz a minha ajuda,
Para as minhas confissões
Como também confusões
E Deus meu que me acuda.
II
Eu me chamo Jovelina,
Sou norteriograndense;
Queimada do sol da praia
Sou purinha natalense;
Porque sou muito mulher
Pois eu digo o que quiser,
Reflita, medite e pense.
III
Meio século de existência
Hoje com essa idade,
Diria Dercy Gonçalves:
Toda língua é liberdade,
Pois tudo que quero eu digo
Sou dona do meu umbigo
Pra toda diversidade.
IV
Isso é democracia
E pra que serve então,
Ter direitos e deveres
Se não usa a expressão?
Afinal, eu não menstruo
Pois, então, eu me instruo,
Sei mais que muito machão.
 V
Das entranhas são três filhos,
Todos machos como o pai;
Sou uma supermulher
Não sinto sequer um ai;
Pois, confesso que vivi
Foi pra isso que nasci
E comigo racha ou vai.
VI
Eu tinha três namorados
Fugia pra encontrar;
Fora, no meio da rua
O rapaz a me esperar;
Sempre fui a mais danada,
Levei surra molestada
E nada de eu chorar.
VII
Eu apanhava demais,
Parecia uma demente;
E nunca me emendava
Mamãe estava descrente,
Por eu ser tão maluvida
Mas, era muito querida
Dela e de muita gente.

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